domingo, 8 de junho de 2014

Blueberry


Blueberry desenhado por Jean 
Giraud. (1)





BLUEBERRY










Outro rosto do Blueberry de Jean Giraud, alguns anos 
mais tarde. (2)
 Naquele tempo que Jean-Michel Charlier se consagra mais e mais em “Pilote”, ele se impõe como um narrador sem igual com suas séries realistas; sobretudo com “Blueberry”, um western desenhado por Jean Giraud, a partir de 1963, que será um de seus maiores sucessos: “Ao curso de minha viagem, que ia chegar ao fim, por uma primeira volta ao mundo, via Taiti [cerca de abril de 1962], eu tinha descoberto a magia do Oeste americano. Após a reportagem na base aérea de Edwards, no Nevada, eu tenho tido vontade, porque era verdadeiramente a porta ao lado, de fazer uma excursão ao Oeste. Eu tinha ficado literalmente deslumbrado! Eu que nunca tinha considerado em minha vida de fazer uma história em quadrinhos western, eu tinha regressado com o irreprimível desejo, precisamente, de escrever uma. Isso se achava que alguns anos antes, Jean Giraud [o futuro Mœbius] veio me encontrar, me perguntando se eu não queria lhe escrever um roteiro de western. Eu lhe havia respondido que isso não era verdadeiramente meu negócio e que eu não tinha vontade de me lançar ali dentro. Retornando dessa viagem, eu procurei um desenhista, esse era ele, e nós temos começado “Blueberry”!”


1963 – A capa, realizada por Jijé, para o primeiro 
número de “Pilote” acolhendo Blueberry, ao nº 
210 de 31 de outubro. 


1965 – O original da prancha 15 do episódio “Le 
Cavalier perdu”.

 Essa história é demais bela para ser esquecida..., Jean-Michel Charlier é tanto um hábil contador de histórias que tomava algumas vezes das liberdades literárias com os fatos! Certamente, nós o temos evocado já muitas vezes, ele havia imaginado, bem antes dessa data, as histórias parecidas àquelas que ele contará em “Fort Navajo”, o primeiro ciclo das aventuras de Blueberry: na novela “Fort Cheyenne”, ilustrada por René Follet, em “Spirou”, em 1949 (existida quase quinze anos antes), na aventura do cowboy Jim Flokers (com as ilustrações de Albert Uderzo, em 1956), nas duas páginas sobre Cochise (ilustradas por Georges Bourdin em “Jeannot”, em 1957), no romance folhetim “Tempête à l’Ouest” (ainda os desenhos de Follet, em “Tintin”, entre 1958 e 1959), etc. Por outro lado, foi mais certamente no retorno de sua segunda viagem aos EUA, sempre com seu amigo, o doutor Juin, no começo do ano seguinte, que o estalo tem devido se produzir, foi ali que ele realiza as reportagens sobre os índios, notadamente nas aldeias secretas dos pueblos, etc.: “Não existe uma só história de “Blueberry” que não seja diretamente inspirada de fatos reais. Existe sempre um ponto de partida estritamente histórico em todas as minhas histórias. Em “Blueberry”, os numerosos personagens secundários têm existido realmente. Eles atravessam essa série com seu verdadeiro nome e no papel que eles têm representado efetivamente na vida...”


1964 – A capa de Jean Giraud para a “Pilote” nº 
262 de 29 de outubro.
 “Eu tenho uma memória que é um pouco como um coador. No primeiro álbum, Blueberry se chamava Steve. Eu tenho esquecido esse prenome e, em seguida, eu o tenho nominado Mike. Isso fez com que, para me recuperar dos brancos, eu tenho colocado Mike Steve Blueberry; e, esse gênero de esquecimento, isso me tem chegado frequentemente.”










1966 – Cartão de votos para o ano 1967 dado de presente 
na revista “Pilote”.


Jean-Michel Charlier caricaturado por 
Jean Giraud.
“Blueberry é, para mim, um personagem bem vivo. Eu havia imaginado, desde os primeiros episódios, todas as peripécias, que eu tenho atribuídas a ele, em seguida, redigindo, tempos depois, sua suposta biografia. São desses antecedentes, desse caráter, desse comportamento, desse passado, que são saídas todas as aventuras de Blueberry. Elas não têm podido se desenrolar de outro modo. Elas resultam inevitavelmente, inexoravelmente de todo esse background, como dizem os americanos.”


 De fato, é em primeiro lugar ao seu amigo Jijé, especialista do gênero, com sua série “Jerry Spring” em “Spirou”, que Charlier se dirige para criar uma história em quadrinhos western. Sobrecarregado de trabalho, Joseph Gillain lhe aconselha bastante um de seus alunos, Jean Giraud, que tinha, certamente, já solicitado o roteirista a esse assunto. O personagem era a antítese do militar clássico, o desenhista o identifica ao ator Jean-Paul Belmondo, que dará mesmo seu consentimento para que os autores se sirvam de seu rosto: “É verdade, a verdadeira série que eu tenho feito um pouco em reação contra minhas outras séries militares, é “Blueberry”. Um personagem, na medida onde ele tem um comportamento ou um caráter particular, se encontra quase fatalmente conduzido rumo a certo destino. É o caso de Blueberry, que é um mau soldado, que não ama o exército, que ama muito os índios e que, de linha em agulha, se encontra levado nas missões mais e mais destrambelhadas, em cujas ele se sai muito mal porque, precisamente, ele é o bode expiatório perfeito.”

 Continuando de “paternar” Jean Giraud, Jijé vai intervir diversas vezes nos cinco primeiros episódios de “Blueberry”, cujo título genérico fica “Fort Navajo”. A princípio, desenhando a primeira capa, colocando em epígrafe essa série para “Pilote” (em outubro de 1963), depois fazendo uma primeira substituição no episódio “Tonnerre à l’Ouest”, em 1964, no momento em cujo o futuro Mœbius era partido ao México para ver sua mãe. No ano seguinte, ele vai se ocupar da capa do primeiro álbum editado por Dargaud, publicado no terceiro trimestre de 1965, e de mais vinte de vinte páginas de “Le Cavalier perdu”. Entre as pranchas desenhadas por Jijé, para essa aventura, duas haviam sido enviadas diretamente à gráfica. Ora, os correios as tem extraviado e Jijé tem devido refazê-las com urgência. Sem lembrar-se precisamente da sua primeira versão, ele vai reinterpretar o roteiro de Charlier modificando os ângulos e simplificando o texto, certamente por preocupação de rapidez. Essas pranchas não hão de ser perdidas para todo mundo, pois, em maio de 2011, alguém tem descoberto que um colecionador tem comprado uma dessas meia-pranchas por ocasião de uma venda nos leilões e que a outra foi igualmente proposta no momento dessa remuneração. Elas haviam sido vendidas, precedentemente, por ocasião de uma venda comum, em 2008, no Drouot, ao mesmo tempo que o original da capa de “Le Cavalier perdu”.



As primeiras versões das meia-pranchas 25a e 26b, do episódio 
de “Blueberry”, “Le Cavalier perdu”, desenhadas por Jijé.


1967 – A prancha original da página 11 do álbum de “Blueberry”, “Le Cheval de fer”, 
desenhada por Jean Giraud.


1983 – Uma ilustração para um portfólio 
das edições Gentiane. (3)
 À exceção dessa curta transição e da ajuda propiciada por Michel Rouge no episódio “La Longue Marche”, em 1980, Jean Giraud desenhará, inteiramente, vinte e três álbuns completos de “Blueberry” e três de “La Jeunesse de Blueberry” escritos por Charlier, dando o melhor de si mesmo. O encontro perfeito de um roteiro e de um desenho: “”Blueberry” é uma série um pouco especial, pois, contrariamente às minhas outras histórias, é uma história em quadrinhos que eu tenho concebido em seu conjunto, sobre uma duração de várias dezenas de álbuns. Desde a estreia, de uma forma pouco detalhada evidentemente, mas com muito de precisão, eu sabia bastante exatamente aquilo que havia de se desenrolar, de álbum em álbum, na narrativa da vida de Blueberry. É tudo feito em particular em relação às minhas outras séries, mas para o resto, é uma série como as outras. Eu tenho evidentemente muito prazer em escrevê-la, mas ela não me põe nem mais nem menos problemas que as outras.”

 Mesmo se frequentemente ele tem acabado de transformar os temas iniciais da série e de enriquecê-los de detalhes pessoais que Jean-Michel Charlier integrava em seu roteiro, Jean Giraud reconhecia em seu roteirista todas as qualidades de um muito bom profissional. Ele vai mesmo declarar que “Charlier organiza as existências, as dirigi a seu bel-prazer... Ele é Deus!” O ponto de vista do roteirista clareia um pouco mais essa colaboração: ”Os desenhistas, com os quais eu trabalho, interveem muito pouco na concepção dos roteiros. Bem entendido, eu os submeto, mas é muito raro que eles me perguntem a menor mudança. Isso que se resulta, às vezes, que Giraud me pergunta de prolongar um papel que eu tinha concebido unicamente como secundário. O caso mais característico é aquele de McClure (4) que devia aparecer durante quatro ou cinco pranchas, no máximo.


1974 – Um retrato “à la Mœbius” de Blueberry por Jean Giraud para as páginas de guarda do álbum “Ballade pour 
un cercueil”.


Giraud encontrou nele um psíquico todo feito em particular e me tem comunicado parte de seu aborrecimento de não mais revê-lo. De golpe, McClure é presente em todos os episódios. Ao contrário, eu chego a intervir no trabalho dos desenhistas, sobretudo para bem explicar-lhes aquilo que eu desejo que eles coloquem em tal ou tal quadrinho. Eu acompanho minha descrição, que é muito detalhada, de um croqui que eu mesmo fiz. Isso não é de tudo para intrometer sobre seu papel de colocar em cena, pois é preciso deixar-lhes toda possibilidade de interpretar as coisas como eles sentem-nas, é simplesmente para indicar-lhes aquilo que eles não devem omitir de fazer figurar no desenho. Isso não ata os desenhistas, que concebem, em seguida, seus desenhos como eles querem; é, geralmente, melhor do que aquilo que eu posso ter imaginado. No entanto, aos desenhistas mais jovens, que começam a desenhar uma série atrás de um predecessor, eu tenho devido sugerir de refazer certos desenhos. Mesmo de frente a Giraud, eu tenho chegado a pedir-lhe de refazer uma capa que eu não considerei boa. Mas isso é sempre passado muito amigavelmente. Bem claro, eu reconheço-lhes, evidentemente, o direito de criticar meus roteiros e de me pedir as mudanças se eles consideram-nas necessárias.”


N. C.: 1973 – Quadrinho 6 da prancha 23 de “L’Outlaw” (“Le Hors la loi” em álbum), publicada na página 46 de “Pilote” nº 709 de 7 de junho. Em “Jean-Michel Charlier vous raconte...”, a prancha desse episódio de “Blueberry” é publicada na íntegra. (5)


Fonte: RATIER, Gilles. Jean-Michel Charlier vous raconte... Bègles, França: Le Castor Astral, 2013.


N. C.:

1) Desenho publicado em “Pilote” nº 305, 26 de agosto de 1965, na página dupla com o artigo “Pilote” vous presente les fameuses “Tuniques Bleues”, les intrépides compagnons de Blueberry et de Graig – “Pilote” vos apresenta os famosos “Casacas Azuis”, os intrépidos companheiros de Blueberry e de Graig -, em cujo foi incluído o anúncio da sequência do episódio “Le Cavalier perdu”, que foi pré-publicado no revista semanal do nº 288, 29 de abril de 1965, ao nº 311, 7 de outubro de 1965, antes de ser lançado em álbum, no primeiro trimestre de 1968, pela Dargaud Éditeur.









Jean Giraud se inspirou no ator Troy Donahue, como o Tenente Matthew Hazard, no cartaz do filme norte-americano "A Distant Trumpet" (“Um Clarim ao Longe”, no Brasil; “A Carga da Brigada Azul”, em Portugal; “La Charge de la 8e brigade”, na França), 1964, dirigido por Raoul Walsh, para uma ilustração do Tenente Blueberry no anúncio, publicado em "Pilote" nº 305, 29 de agosto de 1965, do episódio "Le Cavalier perdu" em curso na revista semanal.

 


2) "Le Dernier Visage de Blueberry", serigrafia. Jean Giraud realizou essa ilustração, de Blueberry, inspirada no ator Charlton Heston atuando em "Will Penny" ("E o Bravo Ficou Só", 1968), filme dirigido por Tom Gries.





3) A ilustração, feita por Jean Giraud, com os três companheiros (da esquerda para a direita: Red Neck, Blueberry e Jimmy McClure), extraída de "Portfolio Blueberry", lançado pela Gentiane em 1983, teve como fotografia de referência Don Terry, Lon Chaney Jr. e Noah Beery Jr. em "Overland Mail", seriado do estúdio Universal, de 1942, dirigido por Ford Beebe e John Rawlins.



4) O velhote baixinho, barrigudo, beberrão, guia, garimpeiro e um dos companheiros de aventuras de Blueberry, é mais conhecido por Jimmy McClure do que por Jim McClure. Ao lado, o engraçado, atrapalhado e corajoso Jimmy por Jean Giraud.










5) O fugitivo fora da lei Mike Blueberry entra uma isolada casa abandonada, em cuja ele encontra uma antiga amiga, Guffie Palmer, no episódio “Le Hors la loi” (“O Fora da Lei”) que foi pré-publicado em “Pilote”, com o título “L’Outlaw”, do nº 700 (5 de abril de 1973) ao nº 720 (23 de agosto de 1973) mais um anúncio no nº 699 (29 de março de 1973) e publicado em álbum, no 4º trimestre de 1974, por Dargaud Éditeur.


Fontes da imagens: BDzoom: o Tenente Blueberry do anúncio em “Pilote” nº 305; as meia-pranchas 25a e 26b de “Le Cavalier perdu”. Bedetheque: Blueberry; prancha original da página 11 de “Le Cheval de fer”; Red Neck, Blueberry e Jimmy McClure. BDklein: capa de “Pilote” nº 210. Romitaman: original da prancha 15 de “Le Cavalier perdu”. Adesso: capa de “Pilote” nº 262; anúncio de “Le Cavalier perdu” em “Pilote” nº 305 e Blueberry nessa página dupla. Dargaud Éditeur: Blueberry e Jimmy em um cartão de votos para o ano 1967. Comic-historietas: Jean-Michel Charlier por Jean Giraud. BDobliees: capa de “Pilote” nº 453. Liberation (foto: Éditions Le Castor Astral): quadrinho 6 da página 23 de “Blueberry” “L’Outlaw” na página 46 de “Pilote” nº 709. Mister Jacq: Blueberry “à la Mœbius” por Jean Giraud; cartaz do filme “La Charge de la 8e brigade”; Blueberry em “Pilote” nº 305; Blueberry-Will Penny; Don Terry, Lon Chaney e Noah Beery Jr. Tearoomofdespair: Red Neck, Blueberry e Jimmy McClure. Thedailyomnivore: Jimmy Mc Clure.

Jean-Michel vous raconte... © Gilles Ratier, Le Castor Astral 2013

Blueberry © Jean-Michel Charlier, Jean Giraud, Dargaud Éditeur


Afrânio Braga




2 comentários:

  1. Achei lindo seu bllogger.
    Muito importante e interessante.

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  2. Muito obrigado, Gisela Bezze!
    As suas palavras são gentis e incentivadoras para o blog, em cujo, para mim, é um prazer e uma honra escrever sobre Jean-Michel Charlier, o maior roteirista da História em Quadrinhos francófona, Jean Giraud, o maior desenhista de HQ de todos os tempos, o universo de Blueberry, um dos mais famosas personagens western da 9ª Arte, e o Velho Oeste americano, palco de tantas lendas, mitos e fatos históricas, os quais integram a História da humanidade.

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